Onde Comer em Montevidéu
Eu já disse e não nego: Montevidéu me fisgou pela barriga. Tem tanto restaurante cheio de história e sabores, tanto prato diferente, e, mais ainda, tanta coisa que a gente já conhece, mas eles conseguem elevar a outro nível de sabor. Tipo o dulce de leche uruguaio, di-vi-no!
As carnes também. Eles levam a qualidade dos cortes, a maciez e a suculência tão a sério quanto os argentinos. E sua principal arma é a parrilla, uma grande grelha inclinada sobre a brasa do fogo da lenha.
Um bom lugar para experimentar parrilla é o Mercado do Porto, que já tem quase 150 anos de história. Dá para sentar em banquinhos nos corredores e assistir aos assadores em ação. Uma dica ali é o El Palenque, onde eu comi uma bela peça de vazio, batata frita e meia porção de legumes no braseiro (que é aquela chapa quente que vem na mesa).
E não deixe de provar o Medio y Medio, que é tipo um frisante de vinho branco. Praticamente todos os restaurantes do Mercado servem.
Outro patrimônio gastronômico uruguaio se chama chivito. Tem em duas versões: o chivito al pan vem em forma de sanduíche, e o al plato é a versão desconstruidona, com tudo separado. Leva um bife fininho e macio a ponto de cortar com uma dentada apenas, sobre o qual vai presunto, queijo e ovo, salada e, normalmente, vem com batata frita.
Já agoniada porque era o terceiro dia no Uruguai e ainda não tinha comido chivito, eu devorei o da foto esquerda no El Navegante, um restaurante uruguaio sem luxo, mas com comida farta na Cidade Velha, e o da direita foi no El Imperio, na esquina da Tristan Narvaja com a Emilio Frugoni. Mas tem chivitos em tudo o que é lugar: é o prato mais fácil de encontrar em Montevidéu.
Eu preciso falar mais sobre esse restaurante, ele é muito doido. Eu almocei lá quando fui visitar a Feira de Tristán Narvaja, depois de conhecer o Babilônia Libros, e foi a combinação perfeita para um domingo de sol. Inclusive, o terraço sobre o restaurante tem vista privilegiada para a feira. Mas chegue cedo, porque costuma lotar!
Além de chivito, o El Imperio serve café da manhã, chorizo, bolos, vários drinques. Mas a decoração desse lugar é o que o torna único: da mesa onde eu almocei, via algumas inscrições feitas bruscamente à mão, como "bar de amigos", também uma bandeirola da China, uma imagem de Cristo do lado de uma boneca velha pendurada na parede, pelo menos dois relógios parados, retratos muito antigos de gente anônima, um lustre sem lâmpada, um extintor de incêndio (será que era decorativo?), uma cadeira pendurada no teto, bem como um carrinho de feira, que, por sua vez, sustentava uma gaiola vazia. E o mais bizarro é que eu concluí que tudo combinava.
Mas tudo isso eu já esperava, o que me surpreendeu foram as massas no Uruguai. Mais especificamente a que eu comi em um lugar supertradicional e charmoso de Punta Carretas, chamado Bar Tabaré.
Foi uma dos primeiros estabelecimentos do bairro, abriu em 1919 como bar de pescadores e armazém de bairro, daqueles de secos e molhados, sabe? E manteve sua origem na decoração, com gavetas de vidro que expõem grãos, massas e feijão e o antigo baleiro, que hoje guarda as rolhas de vinhos bebidos ali. Tem música ao vivo — tocava um forrozinho e outras brasilidades gostosas quando fui — e as mesas na rua são igualmente convidativas.
Tá, mas voltemos à massa. O sorrentino de presunto cru, mussarela e manjericão com molho de tomates secos estava maravilhoso! Mas também tem carnes, peixes e vários outros pratos no Tabaré.
Cafés em Montevidéu
Foi em cafés que eu mais comi nessa viagem. E não só pela manhã: eles costumam ser lugares deliciosos para almoçar também.
Tipo o La Farmacia, uma antiga drogaria que virou café — e ponto turístico. Ele fica na Cidade Velha, e, de fora, nada indica que não seja uma farmácia. Me pergunto quantas pessoas entraram querendo paracetamol ou xampu e saíram com um alfajor.
Todo o mobiliário é em madeira maciça, com armários de boticário que vão do chão ao teto. A decoração é composta por potes de vidro com ervas e raízes, maceadores e, com destaque em uma parede, uma grande página amarelada do Ministério da Saúde que dita a legislação reguladora de medicamentos. Dá para sentir o cheiro do lugar só de olhar as fotos, né?
Eu fiquei altamente tentada pelos bolos, mas como já estava no meu quinto dia de exageros uruguaios, pedi uma salada. Surpreendente, à propósito: levava quinoa, lentilha, sementes de abóbora e grãozinhos de romã que estouravam na boca. Estou há horas querendo reproduzir — mas sinto que vou falhar miseravelmente.
A uma quadra dali tem outro estabelecimento que, acreditem ou não, tem ainda mais história. O Café Brasileiro é o mais tradicional da Cidade Velha, foi fundado em 1877 e mantém a decoração da época. Desde então, foi frequentado por artistas visuais, escritores e músicos como o cantor de tango Carlos Gardel.
Um dos cafés especiais se chama Galeano, em homenagem ao escritor Eduardo Galeano — leva Amaretto, creme e doce de leite (foto). A mesa onde ele sentava para escrever, na janela, à direita de quem entra, segue intocada.
O cardápio do Café Brasileiro é bem extenso, com vários tipos de sanduíches, torradas, saladas e massas.
Eu estou meio culpada por chegar ao final desse texto e não ter ainda mencionado as medialunas. Mas isso acaba já, porque olha o tamanho dessa que comi no Oro del Rhin — era uma luna inteira, vai dizer?!
Essas massas folhadas estão para os uruguaios como o pão francês está para a gente ou o croissant para os franceses — inclusive, lembra muito croissant. Eu só não posso esconder minha frustração por não virem recheadas com doce de leite. Normalmente, elas vem sem nada ou com queijo e presunto. Nesse caso ali, eu pedi uma porção de mermelada (geleia) para acompanhar.
Esse Oro del Rhin tem filiais por Montevidéu, mas eu fui no original mesmo, na Rua Convencion, no Centro. Os ganchos para pendurar chapéus ou paletós em cima das mesas entregam a idade desse café. Isso e a foto tirada naquela mesma esquina pelos anos 1930, com o dono todo orgulhoso na frente, um jovem confeiteiro de origem alemã.
O café é um lugar com cadeiras de madeira já gastas, frequentada por muitos senhores lendo jornais e servido por garçons de camisa e gravata. Depois que eu já tinha ido, me falaram muito bem dos doces dali, mais especificamente da torta de alfajor. Enfim, mais um motivo para voltar a Montevidéu.
O que saber antes de entrar em um restaurante de Montevidéu
- Ver um número tão alto na hora de pagar uma conta pode ser assustador, mas isso ocorre porque um real vale cerca de sete pesos uruguaios (em março de 2023). Ao ver um valor em pesos, eu precisava dividir por sete para me aproximar do preço em reais.
- Acaba sendo vantajoso usar cartão no Uruguai. Isso porque ocorre a devolução de um imposto, o IVA (o ICMs deles), nas despesas feitas com cartão de crédito ou débito internacional em lugares como restaurantes, bares e locadoras de veículo. Você vê o desconto na nota da maquininha, assinalado com "ley 17.934", ou ocorre o estorno depois.
- Muitos restaurantes uruguaios cobram uma taxa de cubiertos (talheres, em espanhol), que é uma porcentagem apenas por sentar na mesa e fazer a refeição no local. Não é valor de serviço, isso eles chamam de propina e é mais um valor adicionado ao final.
Sabendo disso tudo, já dá para montar um roteiro maravilhoso, incluindo boa gastronomia. Como os garçons uruguaios dizem: disfrute!